Com apoio de partidos da base governista e da oposição, a Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira (4) por 358 votos a 32 um requerimento para tramitação em regime de urgência de um projeto que proíbe a introdução de mudanças em novas edições da Bíblia.
A aprovação da urgência acelera a tramitação do texto, que agora pode ser votado diretamente no plenário da Câmara, sem a necessidade de passar pelas comissões temáticas na Casa.
Deputados do PSOL e do Novo que votaram contra a urgência para o projeto consideraram um “precedente perigoso” o Congresso legislar a respeito de texto religioso (leia mais abaixo).
De autoria do deputado Pastor Isidório (Avante-BA), a proposta proíbe “qualquer alteração, edição ou adição aos textos da Bíblia Sagrada, composta pelo Antigo e pelo Novo Testamento em seus capítulos ou versículos”.
Também estabelece que fica assegurada a pregação do conteúdo da Bíblia em todo o território nacional. O projeto não especifica qual seria a sanção para quem descumprir.
Segundo Pastor Isidório, alterações na redação da Bíblia são “flagrantemente uma intolerância religiosa” e “grande ofensa para a maioria dos brasileiros, independente da sua religião”.
Isidório foi o autor do primeiro projeto apresentado na atual legislatura, em fevereiro de 2019. Na ocasião, o deputado protocolou proposta para transformar a Bíblia em “Patrimônio Nacional, Cultural e Imaterial do Brasil e da Humanidade”. Ele é conhecido na Câmara por sempre circular pelas dependências da Casa com uma bíblia na mão (imagem abaixo).
O requerimento de urgência aprovado nesta quarta contou com assinaturas de parlamentares do Centrão (bloco de apoio ao governo), como os líderes de PP, PL e Republicanos, e também da oposição, como as lideranças de PT, PSB e PC do B.
Reservadamente, parlamentares dizem que a urgência foi votada, sem compromisso de votação do mérito do projeto, a fim de atender a um acordo que o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), tinha com o Avante.
“Nós entendemos que a nossa Constituição já nos garante que as nossas organizações, religiosas ou não, têm o seu estatuto e que ela possa, evidentemente dentro do seu regimento interno, conduzir o seu público. Ela [a Bíblia] não deve ser alterada porque ela é uma palavra milenar”, disse.
Durante a votação da urgência, somente quatro partidos se manifestaram contra: PSOL, Novo, PV e Rede.
“Não deveríamos estar votando um projeto como esse. O estado é laico. Isso está presente na Constituição brasileira. A gente está abrindo um precedente muito perigoso, que é o Parlamento legislar sobre o que se faz no interior de cada uma das religiões. Não compete ao Parlamento interferir sobre os objetos de cunho religioso e sagrado. A liberdade do exercício da crença não diz respeito ao que nós fazemos aqui”, disse a deputada Sâmia Bomfim (PSOL-SP).
Ela afirmou que, quando criança, fazia catequese e tinha uma bíblia intitulada “A Bíblia da Criança”, com desenhos. “Era uma forma lúdica de ensinar às crianças o que havia na Bíblia. É isso que está se propondo proibir?”, questionou.
O deputado Gilson Marques (Novo-SC) defendeu que governos, políticos e Estado não podem interferir numa religião nem em um texto sagrado.
“Como se alteração ou não no Brasil fizesse alguma diferença. O texto é internacional, tem em vários países, várias línguas. O texto, diversas vezes, já foi alterado, em diversas línguas, em diversas versões. É o Parlamento que vai decidir qual é o texto correto?”, perguntou.