Um crime que parece distante, mas que se esconde atrás de uma tela de celular ou computador, vem fazendo vítimas diariamente na cidade. Trata-se do estelionato, crime previsto no artigo 171 do Código Penal Brasileiro, que consiste em obter vantagem ilícita, enganando a vítima por meio de artifício ou fraude. Só em 2025, mais de 200 casos já foram registrados no município, e o número segue subindo.
Os golpes, na maioria das vezes, acontecem em negociações de veículos, imóveis, motos e até animais divulgados em redes sociais e plataformas de venda. De forma sutil, o estelionatário se infiltra na conversa entre vendedor e comprador e, sem nunca aparecer, convence as partes a realizar depósitos em contas de terceiros, conhecidas como contas laranja.
💸 Dinheiro Economizado em Anos Some em Minutos
Uma moradora de Cruzeiro do Sul, que preferiu não ser identificada, perdeu R$ 90 mil na compra de uma casa. Ela relatou que viu o anúncio do imóvel no Facebook, entrou em contato e foi atendida por quem dizia ser o filho do proprietário. Tudo parecia certo: ela visitou a casa, conheceu o dono, foi ao cartório, transferiu a propriedade para o próprio nome e, no banco, fez a transferência para uma conta indicada por um suposto tio do vendedor.
“O dono da casa estava comigo, viu tudo, participou de cada conversa com esse terceiro. Por isso não desconfiei. Estou no prejuízo até hoje, pagando aluguel e com a cabeça cheia. Tive que buscar ajuda psicológica”, contou a vítima, muito abalada.
A vítima relatou detalhes do momento em que fez o pagamento: “No dia seguinte, eu fui ver a casa com o sobrinho, que se dizia dono da casa. De fato, ele afirmou ser o dono. Ele me mostrou toda a casa e, no momento da negociação, disse que eu deveria tratar o pagamento com o tio dele. E assim eu fiz. No outro dia, fui ao cartório com ele, passei a casa para o meu nome, transferi a conta de água para o meu nome e fomos ao banco fazer a transferência para o suposto tio dele, que seria a terceira pessoa envolvida. Quando realizei a transferência, o prazo informado para o valor cair na conta era de 15 a 20 minutos. Ele ficou o tempo todo no telefone com esse tio e dizia que o dinheiro ainda não havia caído. Enviei uma mensagem pedindo para ele confirmar com o tio, pois a funcionária do banco havia me informado sobre o prazo de 15 a 20 minutos. Depois, ele me enviou um áudio dizendo que o tio já tinha recebido o dinheiro, estava quitando uma dívida e logo mandaria o comprovante. No entanto, ele ficou aguardando e, segundo ele, o tal tio nunca enviou o comprovante. Diante disso, fui direto para a delegacia registrar um boletim de ocorrência sobre o ocorrido, pois percebi que estava sendo vítima de um golpe. Ele também afirmou que registraria o boletim de ocorrência, mas disse que não tinha recebido nada. Por enquanto, estou no prejuízo, ainda pagando aluguel, enquanto ele permanece na casa. O suposto dono, que passou a casa para mim, continua na casa e também entrou na Justiça, alegando que foi enganado por esse tio. Até então, ele dizia que o homem era tio dele. Porém, ao chegarmos na delegacia, ele declarou que havia sido induzido a dizer que era tio, mas que, na verdade, só tinha visto aquele homem uma única vez. Até o momento, sigo aguardando. Procurei uma advogada, que está cuidando do caso, pois fiquei muito abalada. Tive que passar por psicóloga, porque tudo isso mexeu muito comigo. Sou diabética e isso afetou demais minha saúde. Precisei me afastar do trabalho e fiquei dois dias sem ir por conta dessa situação. Agora, deixei tudo nas mãos da advogada, que está resolvendo o caso para mim”, relatou.
Ela conta que a sensação no momento era de segurança, por ter o vendedor junto e a transação acontecendo de forma supostamente transparente. Mas, minutos depois, veio a surpresa: “Em nenhum momento eu desconfiei, porque ele estava conversando comigo e com o dito sobrinho que ele mencionava. No mesmo instante, senti confiança, pois estava tratando diretamente com o sobrinho, que era, de fato, o dono da casa — a casa estava no nome dele, foi ele quem passou a casa para o meu nome e foi comigo ao cartório. Por isso, tive essa confiança, porque ele estava na minha frente, acompanhando tudo o que estava acontecendo. Inclusive, foi comigo até o caixa para que eu realizasse a transferência para o filho desse suposto tio”.
📲 Golpes Acontecem em Segundos e Deixam Rastro de Prejuízo
De acordo com o delegado Lindomar Ventura, os estelionatários nunca utilizam contas ou números de telefone próprios. “Eles sempre agem escondidos atrás de aplicativos e números cadastrados no nome de outras pessoas, muitas vezes em outros estados, dificultando a localização e o bloqueio desses valores”, explicou.

Em maio, só em Cruzeiro do Sul, foram mais de 20 registros de estelionato. Casos que, segundo o delegado, vão de R$ 20 mil a R$ 100 mil. Um dos golpes mais recentes envolveu a venda de uma caminhonete, com prejuízo de R$ 100 mil para a vítima.
“O cenário ideal para esses criminosos é quando há um terceiro envolvido na negociação. Sempre que surgir alguém indicando outra conta para pagamento ou evitando contato pessoal, desconfie. Negociação de valor alto precisa ser feita presencialmente, de cara a cara, conferindo documentos, contratos e registros”, orienta Ventura.
⚠️ Como se Proteger:
- Evite negociações por WhatsApp ou telefone com pessoas que você não conhece pessoalmente.
- Nunca faça depósitos ou transferências para contas de terceiros.
- Negociações de compra e venda de veículos, imóveis ou outros bens devem ser formalizadas com contrato e conferência presencial dos envolvidos.
- Desconfie de propostas muito vantajosas ou pressa para fechar negócio.
- Se identificar sinais de golpe, registre imediatamente um boletim de ocorrência.
A Polícia Civil reforça o alerta para que a população redobre a atenção. Golpistas se aproveitam da boa-fé e da vulnerabilidade das vítimas. A recomendação é simples: se o vendedor ou o comprador estiverem negociando com outra pessoa pelo celular, peça para conhecer todos os envolvidos e evite qualquer tipo de pagamento antes de formalizar o negócio.
Em tempos de tecnologia, onde tudo parece mais fácil, é justamente aí que mora o perigo. Cruzeiro do Sul registra, mês a mês, vítimas que perdem economias de anos em questão de minutos.
Texto: Giovanna Paixão