O Departamento de Estradas de Rodagem, Infraestrutura Hidroviária e Aeroportuária do Acre (Deracre) informou que prestou esclarecimentos sobre a construção do Ramal Barbary, entre os municípios de Porto Walter e Cruzeiro do Sul, no interior do estado, e que o processo está dentro da legalidade.
Por meio de nota, o órgão sinalizou que pretende manter a construção e informou que o processo está em fase de captação de recursos para contratar profissional habilitado para a obra. De acordo com o Deracre, questão é urgente por conta da seca de rios igarapés, que prejudica o transporte fluvial.
“Reiteramos as informações sobre o ramal que interliga as duas cidades, e apresentamos os relatórios comprobatórios das ações executadas”, disse a publicação assinada pela presidente do órgão, Sula Ximenes.
O trecho é o único acesso terrestre de Porto Walter a Cruzeiro do Sul, e está bloqueado desde dezembro de 2023 após o Ministério Público Federal do Acre (MPF-AC) obter uma liminar dentro de uma ação civil pública que alega impacto a uma terra indígena.
Nessa quinta-feira (11), a Justiça Federal acolheu um pedido do MPF e ordenou que o governo do estado prestasse esclarecimentos em até 10 dias sobre as medidas adotadas para cumprir a decisão do fim do ano passado.
Conforme o MPF, o estado deveria comprovar que realizou o bloqueio da estrada, a fim de suspender danos ambientais, e que comprove a fiscalização e proibição de operação ilegal de balsas na travessia de veículos em rios e/ou igarapé no trecho. De acordo com o órgão, o estado deveria apresentar um relatório mensal, o que não foi feito.
Protesto
Moradores de Porto Walter saíram em passeata no dia 25 de junho para pedir pela reabertura do Ramal Barbary, estrada de terra que liga o município à Cruzeiro do Sul.
Porto Walter, que tem pouco mais de 11 mil habitantes, integra o grupo cidades isoladas do Acre, onde só é possível chegar em aviões de pequeno porte ou em embarcações que podem levar de sete horas a até cinco dias dependendo do nível dos rios que levam a esses locais.
A cidade vive em situação de isolamento e corre risco de sofrer desabastecimento por causa da seca do Rio Juruá.
Produtos alimentícios estragam na viagem até o município — Foto: Éder Farias/Arquivo pessoal
Na cidade, o litro do diesel já custa R$ 9,25 e o da gasolina não sai por menos de R$ 9,90. E com o avanço da seca a situação pode piorar. O nível do Rio Juruá já é a menor para o mês de junho dos últimos cinco anos, já tendo chegado a 1,52 metro na cidade.
“Já estamos passando por uma situação em que já estão evitando trazer frios como frangos, as verduras estão chegando estragadas. O valor do frente consequentemente aumenta, porque os barqueiros tem um custo maior e esse custo é repassado para o comerciante que consequentemente repassa para a população e encarece cada vez mais nosso custo de vida”, lamenta o técnico em telecomunicações, Éder Farias, de 27 anos.
“Porto Walter e Marechal Thaumaturgo já começam a ficar comprometidos no sentido de navegação. A gente sabe que esses municípios dependem quase 100% dos rios como hidrovias, tanto para levar as estivas do comércio, como para fazer o escoamento da produção rural e também o transporte de pessoas”, ressaltou o comandante do Corpo de Bombeiros para a região do Vale do Juruá, Josadac Cavalcante.
Acesso terrestre fechado
Para a população de Porto Walter, no entanto, a situação já poderia ter sido resolvida. Isolada por via terrestre do restante do estado pela maior parte de sua história, a comunidade ganhou, em setembro de 2022, uma estrada de 84km ligando a localidade a cidade de Cruzeiro do Sul.
Parecia o começo de uma nova era para eles, entretanto, pouco mais de um ano após a abertura da estrada, a cidade voltou a ficar isolada. O Ministério Público Federal (MPF-AC) ingressou com uma ação questionando os impactos ambientais na Terra Indígena (TI) Jaminawá do Igarapé e a falta de consulta aos povos indígenas da região antes da construção.
Estrada foi fecha pouco mais de um ano após ser aberta — Foto: Asscom/Prefeuitura
Em dezembro de 2023, a Justiça Federal acolheu o pedido e determinou o bloqueio da via e proibiu novas intervenções no local.
“Esta obra foi executada pela Prefeitura de Porto Walter e pelo Estado do Acre sem autorização dos órgãos federais e sem consultar as comunidades indígenas de forma livre, prévia e informada. Em ação civil pública ajuizada pelo MPF e pelo MP-AC, a Justiça Federal determinou a suspensão das intervenções na área”, afirmava a ação assinada pelo procurador da República Lucas Dias.
Ao g1, na época, o Deracre informou que não havia sido notificado sobre o bloqueio, e ressaltou que a construção da passagem foi concluída com desvio da terra indígena.
Até o final de junho de 2024, porém, a decisão da Justiça Federal mantinha o bloqueio sem previsão para o término.
“A gente sempre teve um sonho da estrada, para melhoria de vida em todas as áreas para a nossa população. Hoje com a estrada embargada vem o sentimento de frustação, de indignação com nossos representantes. Já são dois anos de embargo, um ano da última audiência pública e até agora não foi resolvido nada”, lamenta Farias.
Porto Walter sofre com isolamento terrestre do resto do país — Foto: Macson Alves/Arquivo pessoal
Nota oficial
O governo do Acre, por meio do Departamento de Estradas de Rodagem, Infraestrutura Hidroviária e Aeroportuária do Acre (Deracre), informa que as recomendações solicitadas pela Justiça Federal e Ministério Público Federal, sobre a regularidade do procedimento de abertura do ramal de interligação entre os municípios de Rodrigues Alves (AC) e Porto Walter (AC), foram devidamente cumpridas e respondidas. Reiteramos as informações sobre o ramal que interliga as duas cidades, e apresentamos os relatórios comprobatórios das ações executadas.
Esse processo está em fase de captação de recursos para a contratação de um profissional habilitado, considerando a urgência devido ao decreto de emergência de seca dos rios no estado do Acre.
Sula Ximenes
Presidente do Deracre