Cruzeiro do Sul, Acre 25 de novembro de 2024 16:29

Papa emérito Bento XVI morre aos 95 anos

O papa emérito Bento XVI morreu aos 95 anos neste sábado (31), anunciou o Vaticano.

O alemão Joseph Ratzinger nasceu em 16 de abril de 1927 na cidade de Marktl, mas passou boa parte da infância e adolescência em Traunstein, perto da fronteira com a Áustria.

De família humilde e o mais novo de três irmãos, entrou para o seminário aos 12 anos e era fluente em diversas línguas, entre elas grego e latim. Mais tarde, fez doutorado em teologia na Universidade de Munique.

Ele foi escolhido papa no dia 19 de abril de 2005, após a morte de João Paulo II, no mesmo ano.

Ortodoxo, Ratzinger era conhecido por transitar entre os conservadores com mais facilidade e um dos favoritos para a sucessão papal, mesmo não sendo oficialmente a sua vontade.

O nome adotado por ele foi o de Bento XVI. Na ata da audiência geral, publicada no site oficial do Vaticano, ele explicou as razões para a escolha.

“Quis chamar-me Bento XVI para me relacionar idealmente com o venerado pontífice Bento XV [Cardeal Giacomo della Chiesa], que guiou a Igreja num período atormentado devido à Primeira Guerra Mundial”, disse ele.

“Ele foi um profeta corajoso e autêntico de paz, e comprometeu-se com coragem infatigável primeiro para evitar o drama da guerra e depois para limitar as consequências nefastas”, completou.

São Bento também é o padroeiro da Europa e fundador da Ordem Beneditina.

Bento XVI, no entanto, também viria a ser o primeiro papa a renunciar em 600 anos, após a Igreja Católica se tornar alvo de escândalos envolvendo acusações de corrupção e pedofilia.

Infância em meio ao nazismo na Alemanha

Em um período de ascensão do regime nazista na Alemanha, Ratzinger optou por focar na igreja e em seus ensinamentos como forma de proteção ao movimento.

Mesmo com a decisão, e com o pai também se opondo ao regime de Adolf Hitler, Ratzinger entrou obrigatoriamente para a força auxiliar do Exército em 1941, mesma época em que integrou o seminário preparatório, aos 14 anos.

Papa emérito Bento 16 no aeroporto de Munique antes de partir para Roma / 22/06/2020 Sven Hoppe/Pool via REUTERS
Papa Bento XVI e Paolo Gabriele / Foto: Wikimedia Commons

Já no final da Segunda Guerra Mundial, foi convocado para ajudar nos serviços antiaéreos.

Entre idas e vindas das convocações para o serviço militar, desertou no ano de 1945 após ser capturado por soldados norte-americanos e ficar preso por meses.

Ratzinger, então, decidiu voltar para o seminário, e a sua ordenação saiu em junho de 1951.

Com a batina, o novo padre seguiu nos estudos em teologia e na carreira acadêmica em diversas instituições de ensino europeias, lecionando nas universidades de Bonn e de Muester e ocupando o cargo de vice-reitor na Universidade de Regensburg.

Conhecido por suas profundas reflexões no universo teológico, Bento XVI tem publicações, em diversos formatos, que são conhecidas mundialmente.

As obras “Dogma e Revelação” e “Introdução ao Cristianismo”, por exemplo, são referências universitárias para quem deseja compreender melhor a teologia.

Trajetória na Igreja Católica

Devido ao seu conhecimento acadêmico e científico, o futuro papa contribuía de forma significativa para a Igreja Católica.

Em 1977, foi nomeado arcebispo de Munique e Freising e a sua sagração episcopal foi oficializada no ano seguinte. Tornou-se o primeiro padre diocesano a assumir a arquidiocese da Baviera.

No mesmo ano foi nomeado cardeal e participou de conclaves que elegeram João Paulo I e João Paulo II.

Este último o ordenou prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé – o antigo Tribunal da Inquisição, que ficou conhecido historicamente por perseguir e punir quem se desviava das condutas impostas pela Igreja.

Papa Bento XVI / Guido MARZILLA/Gamma-Rapho via Getty Images

Em 1982, Ratzinger renunciou ao governo pastoral da arquidiocese de Munique.

Em 1998, com a nomeação para vice-decano do Colégio Cardinalício, Ratzinger ficou ainda mais próximo do cargo de chefe de Estado do Vaticano.

Com o nome aprovado pelo Papa João Paulo II, sua eleição para decano foi aceita em 2002.

Eleição

Com a morte de João Paulo II em 2 de abril de 2005, o Colégio de Cardeais articulou para iniciar as discussões para a escolha do novo papa.

Com 1.115 cardeais, as quatro votações foram realizadas, mas apenas no fim do dia de 19 de abril a chaminé do Vaticano soltou uma fumaça branca, anunciando assim a escolha de um novo pontífice.

Ratzinger foi anunciado como novo papa e decidiu ser chamado de Bento XVI. O nome foi oficialmente anunciado em 24 de abril de 2005, em uma missa especial realizada na Praça de São Pedro, no Vaticano.

Bento XVI discursou a favor de uma liderança que abraçava a todos.

“Nas suas pegadas [de Bento 15], desejo colocar o meu ministério a serviço da reconciliação e da harmonia entre os homens e os povos, profundamente convencido de que o grande bem da paz é antes de tudo dom de Deus – dom frágil e precioso que deve ser invocado, tutelado e construído dia após dia com o contributo de todos”, acrescentou durante a audiência.

Mesmo assim, suas alternativas apresentadas em discurso não foram suficientes para o pontífice se ver fora de polêmicas.

Por defender uma Igreja conservadora e fazer afirmações contrárias à adoção de crianças por pessoas do mesmo sexo, foi criticado por parte da imprensa.

Temas como aborto, pedofilia e homossexualidade também foram alvo de discussão.

Em documento registrado no site do Vaticano, o antigo papa chegou a impor restrições aos sacerdotes em seminários.

“A Igreja não pode admitir no Seminário e nas Ordens Sacras aqueles que praticam a homossexualidade, apresentam profundas tendências homossexuais ou apoiam a chamada cultura gay”, comunicou.

Algumas declarações foram dadas durante a sua primeira viagem à América Latina, visitando o Brasil, em maio de 2007.

Ele veio para 5ª Conferência Geral do Episcopado Latino-americano e Caribenho, no Santuário de Aparecida, em São Paulo, para a canonização de Frei Galvão, que tornou-se Santo Antônio de Sant’Anna Galvão.

Em sua passagem pelo país, fez duras críticas à imprensa por considerar que ela não valoriza o casamento e “faz pouco” pela virgindade dos solteiros.

Também criticou o aborto, a pesquisa com embriões e eutanásia, e chegou a negar que a Igreja tenha batizado à força os índigenas do continente americano.

ASSOCIATED PRESS/AE
O então papa Bento XVI, em 2007, durante a missa do Rosário, no Santuário Nacional de Aparecida, no Brasil. / JONNE RORIZ/ESTADÃO CONTEÚDO/AE

Além disso, fez um apelo para que os governos apoiem as mulheres que optam por ficar em casa para cuidar da família.

Bento XVI também foi alvo de críticas quanto a casos de pedofilia envolvendo sacerdotes espalhados pelo mundo.

Acusado de omissão, o papa emérito teve que demitir diversos bispos e promoveu uma “limpeza” depois de um dos escândalos mais emblemáticos ser revelado.

O caso envolvia um padre mexicano que faleceu em 2008. O sacerdote Marcial Maciel abusou sexualmente de diversos seminaristas e teve filhos com inúmeras mulheres.

No final de seu pontificado, os escândalos aumentaram. Em 2012, foi a vez de documentos confidenciais da Igreja serem vazados para a mídia italiana, evidenciando a falta de transparência e acobertando casos de lavagem de dinheiro.

Cartas do próprio pontífice sobre temas sensíveis, como escândalos sexuais e intrigas internas, também foram expostas.

O caso foi batizado pela imprensa italiana de Vatileaks. O mordomo Paolo Gabriele, que trabalhava com o papa desde 2006, foi preso por ter sido responsável pelo vazamento dos documentos até então secretos para o jornalista investigativo Gianluigi Nuzzi.

Gabriele foi julgado no final de 2012 e condenado pelo Tribunal do Vaticano a 18 meses de prisão. Bento XVI o perdoou tempos depois.

Na época, as investigações apontaram que Gabriele não agiu sozinho. Ele teve ajuda de Claudio Sciarpelletti, técnico em informática que trabalhava para a Secretaria de Estado do governo central da Santa Sé, no Vaticano, e tinha acesso às informações.

Riscos

Bento XVI também foi alvo de tentativas de agressão durante o período de governança. Um deles ocorreu em 2007, quando um homem ultrapassou o bloqueio de segurança da Praça de São Pedro e tentou entrar no veículo que transportava o papa entre os fiéis.

Ele foi contido imediatamente e o imobilizaram.

Uma mulher, Susanna Maiolo, também atentou contra Bento XVI duas vezes, em 2007 e 2008.

Na primeira ocasião, ela ultrapassou a segurança, mas foi detida antes. Já na segunda oportunidade, Maiolo chegou a puxar o papa, que caiu durante a Missa do Galo.

Ele não se feriu e continuou a celebração instantes após o atentado.

Na confusão, o cardeal francês Roger Etchegaray sofreu uma queda e quebrou o fêmur, precisando passar por cirurgia. Maiolo foi encaminhada a um hospital e internada para tratamento psiquiátrico.

A renúncia ao papado

O então papa Bento XVI deixa o altar após sua última audiência geral na Praça de São Pedro, no Vaticano, em 27 de fevereiro de 2013. / GREGORIO BORGIA/ASSOCIATED PRESS/AE

Em fevereiro de 2013, aos 85 anos, Bento XVI renunciou ao cargo. Em anúncio feito durante uma reunião com os cardeais, ele revelou o real estado de sua saúde.

“Após ter repetidamente examinado minha consciência perante Deus, eu tive certeza de que minhas forças, devido à avançada idade, não são mais apropriadas para o adequado exercício do ministério de Pedro.”

Com a renúncia formalizada no dia 28 de fevereiro de 2013, Bento XVI deixou oficialmente suas responsabilidades como o maior representante da Igreja Católica.

Ele foi substituído pelo argentino Jorge Mario Bergoglio, intitulado Francisco, em 13 de março de