Paola Schietekat é uma mexicana que morava no Catar. Aos 27 anos, apaixonada por futebol e com mestrado em economia, tinha o emprego que sempre sonhou: trabalhava no Comitê Organizador da Copa do Mundo fazia quase um ano e meio. No entanto, em junho do ano passado, após ter seu apartamento em Doha invadido por um homem que conhecia, mas não tinha relação próxima, passou a viver um pesadelo.
Em entrevista ao Fantástico, Paola diz que, após agredi-la, o homem a ameaçou para que não procurasse as autoridades, mas ela o ignorou. Ao chegar à polícia, no entanto, conta que foi ouvida com desconfiança e teve seu celular retido e, após alguns dias do seu depoimento, saiu da condição de vítima para a de acusada. O crime? Manter uma relação sem ser casada.
A reviravolta aconteceu depois que o agressor, um colombiano, foi ouvido. Ele alegou às autoridades que eles mantinham um relacionamento, o que ela nega. Paola disse que seu novo interrogatório foi feito sem o acompanhamento de advogados nem tradutores para a língua árabe, e afirma que o homem mentiu para se livrar da acusação. Isso porque, pelas leis do Catar, relações sexuais só podem ocorrer no país entre pessoas casadas. Sexo fora de um casamento é crime, para o homem e para a mulher.
Mesmo negando ter uma relação com o agressor e sem evidências que comprovassem o que ele afirmava, a polícia passou a investigá-la.
“Já não interessava a agressão, interessava investigar a relação fora de um casamento. E me interrogaram em árabe por três horas. Esse interrogatório que fizeram foi simplesmente com o objetivo de me incriminar. Uma das primeiras coisas que me pediram foi uma prova de virgindade. Isso é, inclusive anticientífico. Tem mulheres que nascem sem hímen, tem mulheres que não têm hímen, perdem na infância. Não é garantia de nada. E, além de ser anticientífico, é violento. Eu poderia ter tido relações antes e fora do Catar. E me pedir prova de virgindade não comprova nada. O conceito da virgindade é muito agressivo. Por que para um homem não pedem o mesmo?”, lamenta.
A polícia dispensou Paola da prova de virgindade, quando ela apresentou um documento que provava que já havia sido casada no passado, mas a mexicana acabou sendo condenada a sete anos de prisão por ter tido uma relação sexual sem ser casada. Por ser muçulmana, ainda levaria 100 chibatadas.
Com apoio do Comitê Organizador da Copa, mesmo condenada, Paola conseguiu deixar o país e voltar para o México. Ela pediu demissão e expôs o caso nas redes sociais. Publicou as fotos das agressões, compartilhou a punição que recebeu, e o episódio ganhou grande repercussão internacional.
Com o olhar da imprensa estrangeira sobre o caso, Paola recorreu da condenação e teve uma notícia animadora no início do mês de abril: a justiça do Catar decidiu devolver a acusação para a Procuradoria, indicando o arquivamento do caso. Os procuradores, agora, decidem se arquivam ou se fazem nova denúncia.
O acusado da agressão, que não teve a identidade revelada, não foi alvo do processo e sequer foi investigado.
Sobre o caso da Paola, a Fifa respondeu, em nota, que acompanhou de perto o episódio e que, como sobrevivente de abuso, a mexicana deve receber cuidados e assistência adequados e que continuará acompanhando o caso até que esteja totalmente encerrado.