Cruzeiro do Sul, Acre 21 de maio de 2025 19:24

Nova interpretação do TSE deixa Nicolau elegível para concorrer ao Governo; entenda

No ano de 2021 o Tribunal Superior Eleitoral deu nova interpretação à Súmula Vinculante n. 18 do Supremo Tribunal Federal. Não foi um juiz de Zona Eleitoral ou um Tribunal Regional Eleitoral. Foi a maior Corte Eleitoral do país.

A votação se deu por 5 votos a 2, sendo cinco Ministros favoráveis à nova interpretação e dois contrários. O voto vencedor, divergente, foi do Ministro do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes, que foi seguido por outros dois Ministros do Superior Tribunal de Justiça, Mauro Campbel e Luiz Felipe Salomão, e os outros dois da classe de juristas.

Houve dois votos contrários, de dois Ministros do Supremo Tribunal Federal, Luiz Roberto Barroso e Edson Fachin, que, mesmo discordando de Alexandre de Moraes, por entender que a nova interpretação era um “desprestígio” à Súmula Vinculante 18 do STF, reconheceu que a tese vencedora era “respeitável”.

A Súmula Vinculante n. 18 do Supremo Tribunal Federal, do ano de 2009, teve seu verbete assim redigido: “A dissolução da sociedade conjugal ou do vínculo conjugal, no curso do mandato, não afasta a inelegibilidade do § 7º art. 14 da Constituição Federal”.

No entanto, no julgamento recente do TSE, Alexandre de Moraes propôs uma nova interpretação a partir das razões de decidir (ratio decidendi) de precedentes do Supremo Tribunal Federal.

Alexandre de Moraes lembrou aos dois colegas do Supremo Tribunal Federal, compondo o Tribunal Superior Eleitoral, que o que importa em uma Súmula Vinculante é o verbete, não o julgado: “Não existe inelegibilidade reflexa em caso de interstício de mandatos”.

O objetivo da Súmula Vinculante n. 18 do Supremo Tribunal Federal, que é evitar a perpetuação do mesmo grupo familiar no poder, está cumprido quando há separação de fato, na relação de parentesco, no mandato anterior.

Esta é a nova interpretação da Súmula 18 do STF dada pelo Tribunal Superior Eleitoral, que, justamente em matéria eleitoral, teve sua soberania reconhecida e confirmada como absoluta pelo próprio STF, nas eleições presidenciais de 2018, quem não se lembra?

O cerne da nova interpretação da Súmula Vinculante 18 do Supremo Tribunal Federal está na expressão “separação de fato”. Isto é, não importa se, formalmente, o vínculo do casamento, da relação, foi rompida com o divórcio dentro do último (segundo) mandato do parente (cunhado, esposo, irmão), mas se, realmente, na prática, o casal já havia se separado no mandato anterior, ou seja, no primeiro mandato.

Esta situação, no entendimento acertado de Alexandre de Moraes e do TSE, atende a Súmula Vinculante 18 do STF, porque, verdadeiramente, na realidade fática (não de direito, formal), entre o primeiro mandato de quatro anos do parente e aquele mandato que o candidato pretende assumir, houve um interstício de um mandato inteiro (o segundo do parente), no meio, sem que existisse a relação de parentesco de fato.

No caso do Acre?

No caso do Acre, os requerimentos de registros de candidaturas de parentes, que foram levados à Justiça Eleitoral, foram indeferidos, porque o entendimento do Tribunal Superior Eleitoral, até o ano de 2021, era outro, ou seja, da observância da Súmula Vinculante 18 do STF, literalmente.

Se estas candidaturas, dos irmãos Viana e da candidata de Mâncio Lima, fossem apresentadas agora, isto é, após o ano de 2021, já para as eleições do ano de 2022, teriam seus registros deferidos pela Justiça Eleitoral, mesmo se estivessem no poder até o ano 2020, porque a jurisprudência desde então é outra, favorável.

O entendimento do Tribunal Superior Eleitoral pode mudar de novo, como tudo muda, de acordo com a composição dos membros, mas no momento é este, assim como o entendimento do Supremo Tribunal Federal, como um todo, também pode mudar, em relação à Súmula Vinculante 18, homenageando o Tribunal Superior Eleitoral, concordando com sua nova interpretação.

Neste momento, acaso o atual Presidente da Assembleia Legislativa do Estado do Acre, deputado Nicolau Junior, pretendesse – e se esta fosse a vontade do partido/federação, que não parece ser o caso – ser candidato ao cargo de Governador, de acordo com a nova jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, estaria elegível, à toda evidência.

Presidente da Aleac, deputado Nicolau Júniro/ Foto: Ascom

Aqui, não manifestamos preferências, competindo aos partidos, federações e candidatos legitimados a escolha de seu representante, nas eleições de 2026, conforme merecimento, pesquisas e articulações políticas.

Quando o Governador Gladson Cameli, em meados do mês de janeiro de 2023 (primeiros dias – ainda tem isso – do primeiro ano do segundo mandato), anunciou que, a partir daquele momento, sua ex-mulher, senhora Ana Paula, não era mais primeira dama, oficialmente, deixou claro que a separação de fato já havia ocorrido no ano anterior.

Imediatamente, a imprensa toda do Acre, sem exceção, publicou a mesma coisa, de que o Governador estava anunciando apenas aquilo que todo mundo já sabia, que estavam separados de fato (TSE) desde a metade do ano de 2022, tanto que a senhora Ana Paula não participou da campanha eleitoral, não esteve presente na diplomação, não apareceu na posse e sequer foram morar juntos no palácio particular recém construído em condomínio de luxo de Rio Branco.

Os mais cautelosos ou temerosos, e não deixam de ter razão em parte, logo argumentam que seria uma candidatura sub judice, porque, por meio de recurso extraordinário, o Supremo Tribunal Federal iria julgar eventual impugnação, e faria valer a Súmula Vinculante 18, considerando Nicolau Junior inelegível.

Mas não é bem assim.

Primeiramente, a condição sub judice seria favorável ao candidato, se fosse Nicolau Junior, que estaria com seu pedido de registro de candidatura deferido pelo Tribunal Regional Eleitoral e, em caso de recurso de algum partido, candidato ou Ministério Público, mantido pelo Tribunal Superior Eleitoral, já que esta é a nova jurisprudência.

É muito diferente do candidato que concorre sub judice, porque teve seu registro de candidatura negado pela Justiça Eleitoral, no começo, no registro da candidatura. Aí recorre, entra com pedido liminar, recorre de novo, ainda em busca de confirmar sua candidatura. Neste caso, a possibilidade de lá na última instância eleitoral ou no STF se confirmar a decisão inicial de indeferimento do registro da candidatura é grande.

Em segundo lugar, porque eventual recurso extraordinário para o Supremo Tribunal Federal, iria causar um “conflito” não entre o candidato e o Supremo Tribunal Federal, mas entre o Tribunal Superior Eleitoral e o Supremo Tribunal Federal. É que pelo mesmo motivo que algum candidato ou partido estaria indo ao STF, por meio de recurso extraordinário (Separação de Fato/Súmula Vinculante/Inelegibilidade), alguns já foram ao Tribunal Superior Eleitoral e obtiveram um provimento favorável com margem expressiva de votos ou com a confirmação do novo entendimento, como resposta à consulta formulada.

Acaso viesse a ser candidato, o que parece não ser o caso, Nicolau Junior estaria chancelado pela Justiça Eleitoral, que deu nova interpretação à Súmula 18 do Supremo Tribunal Federal, e não haveria como o Excelso Tribunal indeferir (sem longuíssimo, de anos, debate sobre a atualidade e prevalência da tal Súmula Vinculante) o registro de sua candidatura, se foi deferido em decisão da Corte Especializada, que deu nova interpretação a sua súmula vinculante.

E, mais, que manteve tal entendimento mesmo após nova consulta no ano de 2023, feita por um partido político, sobre idêntico caso do Acre, quando o TSE se recusou a responder, informando que já tinha firmado entendimento favorável a candidatura do parente separado de fato no mandato anterior, baseado naquele julgamento em que atuou e relatou o voto divergente vencedor, o Ministro do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes.

Nos tempos modernos, seria a primeira vez que o Supremo Tribunal estaria desautorizando o Tribunal Superior Eleitoral, a quem tanto prestigia, em tão relevante tema, causando melindres entre os colegas e mal estar indesejável.

A matéria é tão complexa – se vale o verbete ou um julgado de uma Súmula Vinculante, se a interpretação dada pelo TSE é certa e definitiva e o STF é que tem que se adequar, se a separação de fato torna o candidato elegível – vez que se estará dezessete anos após o julgado (a súmula é de 2009, a eleição será em 2026), que, no mínimo, se estabeleceria uma discussão demorada no Pleno do STF, para dirimir o assunto, sem prejuízo das candidaturas já deferidas pela Justiça Eleitoral, indubitavelmente.

Evidentemente, candidatos, partidos, coligações e federações se cercarão de toda a assessoria e segurança jurídica altamente especializada de Brasília, cujos partidos tem seus advogados nacionais, para decidir se entram na disputa de tão relevantes cargos majoritários.

De nossa parte, tivemos a honra de conversar com o Deputado Nicolau Junior, dois anos atrás, sobre o assunto, em cuja oportunidade manifestamos nossa opinião jurídica, fundada na jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, que debateu justamente a famosa Súmula Vinculante 18, dando-lhe nova interpretação, repetidas vezes, sem preferência política ou pessoal, de forma independente.

Gilson Pescador
Advogado OAB/AC 1.998